*Por Anderson Farias, CEO da TopSaúde HUB
No Brasil, o acesso à saúde suplementar ainda é um privilégio que se conquista com um crachá. A carteira assinada é o passaporte para a medicina privada, transformando o emprego formal no principal elo entre o trabalhador e um sistema de saúde mais ágil e abrangente. À primeira vista, parece uma relação equilibrada: a empresa oferece um benefício que valoriza o funcionário, e o plano coletivo garante escala e sustentabilidade. Mas basta olhar um pouco mais de perto para perceber que essa estrutura se apoia em bases desiguais e frágeis.
Mais de 70% dos beneficiários de planos de saúde no país estão ligados a contratos empresariais, o que corresponde a cerca de 37 milhões de pessoas. A imensa maioria desses contratos nasce em micro e pequenas empresas que, mesmo enfrentando margens apertadas, tentam manter o benefício para suas equipes. São padarias, salões de beleza, escritórios e pequenos comércios que sustentam a capilaridade do sistema. No entanto, o volume e a estabilidade financeira que mantêm as operadoras de pé vêm de outro lugar. Um grupo diminuto de grandes corporações, menos de 0,1% das empresas contratantes, concentra mais de 40% dos beneficiários. Essa discrepância cria uma dependência estrutural: enquanto a base garante pulverização, o topo assegura o equilíbrio econômico.

O setor em que se trabalha também dita a qualidade da cobertura. Na Indústria, a média de beneficiários ultrapassa o número de empregos formais, um indício de que os planos se estendem aos dependentes, promovendo uma proteção mais ampla. Já no Comércio e nos Serviços, a cobertura é mais restrita, muitas vezes limitada ao titular. Nos segmentos Agropecuária e Construção Civil, a situação é ainda mais crítica, marcada pela informalidade e pela alta rotatividade da mão de obra. O resultado é uma desigualdade de acesso que reflete o próprio retrato do mercado de trabalho brasileiro.
Essa relação tão direta entre emprego e saúde cria uma vulnerabilidade que o país insiste em ignorar. Quando o trabalhador perde o emprego, não é apenas o salário que desaparece. Some junto o acesso a consultas, exames e internações. Em tempos de crise, isso significa que milhões de famílias ficam subitamente desassistidas, à mercê de um sistema público já sobrecarregado. Para os aposentados, a transição é igualmente dura: após décadas de contribuição e vínculo, muitos se veem excluídos de um modelo que valoriza apenas quem ainda está na ativa.
Além das disparidades econômicas e setoriais, há o componente geográfico que aprofunda a desigualdade. A concentração de empregos formais e serviços de saúde no Sudeste faz com que o elo entre trabalho e assistência seja muito mais sólido em São Paulo ou no Rio de Janeiro do que em estados do Norte e Nordeste, onde a informalidade e a distância dos grandes centros limitam as opções de cobertura.
O futuro da saúde suplementar no Brasil passa, inevitavelmente, pelo futuro do trabalho. Se as modalidades de emprego estão se transformando, com o avanço dos autônomos, freelancers e profissionais de plataformas digitais, o modelo de benefício atrelado exclusivamente ao vínculo formal tende a se tornar obsoleto. É urgente repensar o acesso à saúde privada sob uma lógica mais inclusiva e flexível, capaz de alcançar também quem não cabe nas estruturas tradicionais.
Garantir o equilíbrio desse sistema exige mais do que manter os grandes contratos corporativos. É preciso criar alternativas sustentáveis para pequenos negócios e soluções acessíveis para os milhões de brasileiros fora do mercado formal. A saúde não pode ser um privilégio condicionado à assinatura de um contrato de trabalho. Um país que pretende amadurecer suas políticas de bem-estar precisa romper essa dependência e construir um modelo em que o cuidado não esteja vinculado ao crachá, mas ao cidadão.
*Anderson Farias é CEO da TopSaúde HUB, parte do ecossistema da Interplayers, e líder em soluções tecnológicas para a gestão da saúde suplementar, oferecendo um ERP inovador que centraliza e otimiza processos para operadoras, administradoras e autogestões de todos os portes – E-mail: topsaude@nbpress.com.br.
FONTE: NB Press Comunicação










