Separação entre propriedade e gestão costuma ser um dos pontos mais delicados ao abordar a sucessão
NO BRASIL, 90% das empresas têm perfil familiar, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e empregam 75% da mão de obra no País, respondendo por mais da metade do PIB.
Dados da Susep indicam que o Brasil conta atualmente com mais de 135 mil corretores de seguros, dos quais 43% operam como pessoas jurídicas. Muitas dessas empresas são familiares.
Diante disso, preocupa saber que, segundo um estudo do Banco Mundial, apenas 30% das empresas familiares chegam à 3ª geração e só metade disso, ou seja, 15%, sobrevivem à sucessão de três gerações.
Para corretoras de seguros, esse índice pode ser menor, já que o relacionamento com clientes e seguradoras costuma estar concentrado em uma ou duas pessoas-chave, além de, tradicionalmente, os corretores focarem apenas no crescimento imediato e em resultados de curto prazo, aponta o professor do IBMEC e especialista em governança corporativa, gestão empresarial e liderança, Isaac Ferraz.
Mas com o envelhecimento da categoria e a forte dependência da figura do corretor titular colocam a sucessão empresarial no centro das discussões do setor no Brasil. Levantamentos recentes indicam que cerca de um terço dos profissionais têm mais de 55 anos, o que acende o alerta para a continuidade das carteiras.
Nesse sentido, a sucessão empresarial se faz necessária, com o objetivo de garantir que a corretora siga operando em casos de aposentadoria, falecimento ou incapacidade de um dos sócios.
De acordo com o professor, a sucessão não é apenas transferência de propriedade, mas de conhecimento, valores e visão estratégica. “Hoje a estratégia de longo prazo se tornou fundamental. Os mais visionários já estruturam processos de governança, definem papéis e responsabilidades e implementam uma cultura que transcende a figura do fundador. Corretores que antes operavam de forma intuitiva agora buscam capacitação em gestão e liderança, estruturando indicadores de performance e aplicando metodologias como o PDCA (que significa, Planejar-Fazer-Verificar-Agir) para sustentar a continuidade”, afirma.

Andrea Carrasco, superintendente sênior de Recursos Humanos do Grupo Bradesco Seguros, também reforça essa visão: “A longevidade do negócio é um tema que vem ganhando cada vez mais relevância no setor de corretagem de seguros”.
“A sucessão empresarial, nesse contexto, deixa de ser uma preocupação distante e passa a integrar a agenda de planejamento das corretoras. O Grupo Bradesco Seguros compreende a importância desse olhar estratégico por parte deles e tem atuado com foco em apoiar seus parceiros na perpetuidade de empresas sustentáveis”, ressalta.

O preparo da sucessão
Com tantas corretoras como empresas familiares, a sucessão traz não só urgência no tema, mas desafios específicos. Dados apontam que os sucessores internos têm ganhado espaço, cerca de 70% das corretoras já têm sucessores internos identificados, sendo a maioria familiares diretos.
Neste cenário, a separação entre propriedade e gestão costuma ser um dos pontos mais delicados. “Trabalho com protocolos familiares, definição clara de papéis e treinamento de sucessores para que a tomada de decisão seja baseada em critérios técnicos, e não apenas em relações pessoais. A profissionalização é fundamental para equilibrar interesses da família e necessidades do negócio”, explica Ferraz.
Segundo o especialista, mesmo quando o sucessor é um filho ou parente, é preciso preparo e apoio com antecedência. Sem planejamento, o risco é alto: estudos apontam que até 40% das empresas brasileiras podem estar em risco até 2030 por falta de sucessão. Para corretoras, o impacto pode ser imediato, tais como perda de carteira, descontinuidade nos repasses de comissão e ruptura nos contratos com seguradoras.
Marcos Kobayashi, diretor Comercial Nacional Varejo e Vida da Tokio Marine, complementa ao declarar que a ausência de planejamento e a centralização em poucos profissionais tornam o negócio vulnerável. “A sucessão precisa ser tratada com profissionalismo. Seja familiar ou com colaboradores internos, é necessário investir em capacitação, atratividade e gestão para tornar a corretora viável a longo prazo”, afirma.
Na visão de Andrea, esse desafio envolve múltiplas dimensões: “Os desafios enfrentados pelos corretores em processos sucessórios estão ligados, principalmente, à preparação adequada dos sucessores, à gestão da transição de maneira fluida e ao equilíbrio entre tradição e inovação no negócio”.
“Muitas vezes, a ausência de um planejamento formalizado pode comprometer a continuidade da corretora. Soma-se a isso a necessidade de lidar com aspectos comportamentais e emocionais que envolvem a passagem de bastão entre gerações, especialmente em estruturas familiares”, acrescenta.

O papel das seguradoras na sucessão
Para apoiar corretores, já existem iniciativas de mentoria e capacitação específicas para a sucessão. Um exemplo são os programas oferecidos pela Bradesco Seguros. A companhia, por meio de iniciativas como o Programa Ciclos, fomenta esse movimento, incentivando o desenvolvimento de lideranças e a continuidade dos negócios em um mercado cada vez mais dinâmico.
“O Grupo Bradesco Seguros atua na capacitação dos corretores com iniciativas como a Universeg, que oferece conteúdos de gestão, inovação e relacionamento. Esses esforços apoiam, sobretudo as corretoras familiares, ao fortalecer a governança e preparar as novas gerações para liderar com visão estratégica”, detalha Andrea Carrasco.
Já o Programa Ciclos, conduzido por especialistas do mercado, busca preparar os profissionais para assegurar a continuidade do negócio com consistência e alinhamento às melhores práticas, e já apresentou resultados consistentes ao longo de três edições, com mais de 210 profissionais ativos nas aulas online e presenciais.
Em fevereiro de 2025, foi iniciada a segunda fase do programa, com o propósito de fortalecer os aspectos práticos do processo de preparação sucessória.
“Por meio deste programa observou-se que todos os indicados como sucessores já se encontravam em processo de transição ou em pleno exercício de suas funções. Os sucessores identificados pertenciam majoritariamente ao núcleo familiar — filhos(as) e genros — ou eram colaboradores internos que ocupavam posições estratégicas de liderança dentro das corretoras”, pontua Andrea.
Já a Tokio Marine tem incentivado esse planejamento sucessório através de programas como a Universidade Parceiros Tokio Marine (UP) e a plataforma BrokerTech, que oferecem ferramentas de gestão de carteira, comissionamento e análise de dados. “Nosso objetivo é evitar que corretores desistam no meio do caminho por falta de estrutura e visão de longo prazo. Queremos que suas empresas continuem existindo por décadas”, ressalta Kobayashi.
Outro exemplo de apoio aos corretores empreendedores no mercado é a plataforma gratuita “Aceleradora”, criada em 2024 pela Suhai Seguradora, em parceria com o SEBRAE, direcionada a corretores de seguros empreendedores e com foco em oferecer conhecimentos não só em gestão do negócio, mas na sucessão das empresas.
“Desde que foi criada, a Suhai vem trabalhando para incluir cada vez mais pessoas no mercado de seguros, e isso também passa, naturalmente, por nossos corretores e assessorias. Vemos um movimento muito forte de empreendedorismo no nosso mercado, e com a Aceleradora queremos ajudar os corretores a crescerem como empresários”, comenta Eduardo Grillo, diretor executivo comercial da seguradora. “Esta parceria com o SEBRAE reforça nosso compromisso em oferecer soluções inovadoras e estratégicas para nossos parceiros”, completa.

Conforme Ferraz, que também desenvolve programa sobre o tema, os resultados são expressivos: enquanto a perda média de clientes em processos sucessórios gira entre 15% e 20%, as corretoras que passaram por programas estruturados conseguem eliminar praticamente essa perda.
“A sucessão empresarial nos seguros representa tanto um desafio quanto uma oportunidade única para a consolidação e crescimento do mercado. A implementação de práticas estruturadas de Governança Corporativa, Mentoria Executiva e Gestão Estratégica tem se mostrado fundamental para o sucesso desses processos. Observamos evolução nas competências de liderança, melhoria contínua dos processos e maior satisfação de stakeholders”, pontua.
“O futuro do setor depende da nossa capacidade de formar líderes preparados para os desafios de um mercado em constante transformação, onde a agilidade, inovação e profissionalismo são diferenciais competitivos essenciais”, conclui Ferraz.
Conteúdo da edição 2 da Revista da Aconseg Centro-Oeste











